segunda-feira, 15 de dezembro de 2014

Neste mês comemoro 20 anos que me formei em Filosofia

Postado por Alexandre Panosso Netto

Neste mês de dezembro de 2014 completam-se 20 anos de minha formatura no curso de Filosofia.

Eu morava e estudava na cidade de Itaúba, no Mato Grosso, a 180 km da casa de meus pais. Completado o segundo grau em 1991, em novembro daquele ano fui fazer vestibular em Campo Grande, Mato Grosso do Sul-MS, para o curso de Filosofia nas Faculdades Unidas Católicas de Mato Grosso (FUCMT; hoje Universidade Católica Dom Bosco-UCDB). Passei em sexto lugar na classificação geral.

O estudo de filosofia foi iniciado em fins de fevereiro de 1992. Curso de 3 anos. Lembro que eu e alguns amigos que também eram do interior andávamos pelas ruas admirando os belos e altos prédios da capital. Tudo era novo para nós.

Em 1992, no primeiro ano de faculdade, a FUCMAT era localizada na área central de Campo Grande, na Avenida Mato Grosso. Em 1993 mudou-se para uma região afastada da cidade, local onde hoje é a UCDB. Uma grande área verde, alta, de onde é possível ver toda a cidade.
UCDB nos dias atuais. Fonte: www.ucdb.br
O curso de filosofia da FUCMAT havia sido reconhecido pelo MEC pela Portaria Ministerial 106, DOU de 17 de março de 1983. Tínhamos disciplinas básicas em qualquer curso de licenciatura, tais como metodologia científica, sociologia geral, história geral e estudos dos problemas brasileiros. Também haviam as específicas e que encantavam e deixam loucos os colegas, tais como:
Lógica
Teoria do Conhecimento
Ética I e II
Filosofia geral: problemas metafísicos
História da filosofia de I a V
Antropologia I e II

Ao iniciar os estudos, lembro-me que tudo o que eu acreditava começou a ser questionado pelos autores que li. Heráclito e Parmênides, - tudo muda; não há mudança - logo na primeira semana; uma resenha crítica dos “Diálogos” de Platão para dali a quinze dias; Aristóteles e Sócrates tomavam café e almoçavam conosco. Nietzsche, com “O anticristo”, abalou com minha fé no homem, no mundo e no cristianismo. São Tomás de Aquino, e sua “Suma teológica” foi utilizado para contrabalancear o baque existencial. Depois ainda tinha as “Confissões” de Santo Agostinho, um “mea-culpa” de sua vida desregrada, que teve uma “segunda leitura” apresentado por um professor ateu de filosofia.
Colegas da Filosofia: João Valdivino, eu, José Rita Lara, Gilberto Siqueira. Acho que era em 1993. 
Os meses de leituras e debates com os colegas de turma e com os das turmas mais velhas foram nos deixando complexos e perplexos. Em Heidegger esperava encontrar a chave dos problemas existenciais, mas minha inexperiência acadêmica e a sua linguagem árdua e pesada impediram-me de continuar lendo-o. Busquei aconchego em Wittgenstein, voltei em Aristóteles e alguns outros autores como Baptista Mondin, Teilhard de Chardin e Régis Jolivet, mas acabei gostando mesmo de Jean-Paul Sartre; talvez porque os problemas existenciais abordados por ele falavam diretamente a mim naquele momento de decisão. E ainda tínhamos professores que falavam do "não ser" da Filosofia da Libertação; e outros que nos diziam que tudo isso era bobagem. A leitura de “O muro” de Sartre foi fulminante – era um livro sobre mim, pensei. (Adendo:  porque todos os estudantes de filosofia que conheço gostam de Sartre?).
Eu com alguns indígenas que faziam parte do projeto de educação. Missão Salesiana em Sangradouro, Mato Grosso.
A UCDB é uma instituição religiosa e católica e desenvolve muitos trabalhos sociais. Em 1994 surgiu a oportunidade para eu fazer parte um projeto de educação indígena com Xavantes no interior de Mato Grosso, a 350 km de Cuiabá. Fui selecionado, no início de 1994, para trabalhar com História do Brasil, e em abril de 1995 para trabalhar com Filosofia da Educação. A escola indígena ficava na aldeia Sangradouro, perto da cidade de Primavera do Leste-MT. Entre março, abril e dezembro de 1994 e entre abril e maio de 1995 vivi uma das minhas melhores experiências. Tive a possibilidade de aprender e ensinar. Para mim eu estava no centro do encontro de culturas, à qual apenas havia lido nos livros de história. Estar vivenciando tal momento proporcionou-me um amadurecimento intelectual e pessoal comparado à melhor das viagens que podemos fazer. Foi neste momento que comecei a me interessar mais por história e iniciei a leitura de Lévi Strauss, Darci Ribeiro, Fernand Braudel, Edward Palmer Thompson, Eric Hobsbawm, Gilberto Freire, Buarque de Holanda, Jacques Le Goff, etc, etc, etc.
Colegas de futebol, rodas de tereré e de filosofia: Marcos Antonio Reichel, Vivaldo Bispo dos Santos, eu, José Hercílio Pessoa (hoje padre) e Mário Augusto Bueno.
O estudo de filosofia para mim, desde meu ingresso no ensino superior, foi vital. Creio que nem preciso explicar o importante papel que a filosofia tem nos dias atuais ao desvelar a realidade, ir ao âmago das questões existenciais e metafísicas, proporcionar uma melhor compreensão do papel de cada um neste curto momento que passamos por este planeta. Infelizmente, nem sempre esse papel é valorizado e a reflexão filosófica é vista como algo desnecessário e banal. Banal, na realidade, é o ato que despreza o filosofar.

Gosto de falar de filosofia; gosto de ouvir quem sabe filosofia; gosto de ler textos filosóficos. Se sou um filósofo? Não, não me considero um filósofo, mas sim um estudante de filosofia. Sempre serei estudante neste quesito. Filósofos para mim - nomearei apenas dois - eram o padre Walter Boch (in memoriam) e o padre Luiz Ferracini (ainda na ativa). Ambos meus professores. Dois escolásticos. Dois grandes teóricos que falavam de coisas que somente 20 anos depois começo a entender.

Ao terminar meu curso, em dezembro de 1994, eu era professor de filosofia no ensino médio há dois anos. Sai do curso, não igual a quando entrei, mas sim profundamente mudado. Porém, não passei pela filosofia; ela ficou em mim. Então, repentinamente, uma realidade me assombrou:
estava eu condenado (no sentido sartreano) a ser professor de filosofia?

Eu achava que faltava algo técnico em minha vida. Uma conhecimento técnico. Foi quanto, em 1995, a mesma UCDB ofereceu um curso novo, coisa futurista pensava eu; algo que ninguém de minha turma de amigos e colegas de filosofia tinha pensado: TURISMO.
Estava com letras vermelhas no cartaz de novos cursos da universidade. Não tinha a menor idéia do que seria aquele curso. Mas, com estava engajado no estudo de idiomas e sonhava em viajar, pensei que poderia ser uma boa opção. Eu também queria ver o mundo de outro ângulo. Fiz o vestibular no final de 1994. Fui classificado em 13º lugar. É aí que meu envolvimento emotivo e profissional com o turismo se iniciou.

Bom, mas isso é outra história, para outra postagem ou para alguma garrafa de bom vinho. Se alguém me convidar, pode ser que eu conte o segundo capítulo.