domingo, 21 de novembro de 2010

Sobre a discricionariedade

Recebemos o artigo, como colaboração, da acadêmica Louise Machado da Costa de Carvalho, do quarto semestre do curso de Gestão de Políticas Públicas da EACH/USP.
Foi redigido para a disciplina de Direito Administrativo e versa sobre administração pública.
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 E então, princípios
            Sabe aqueles dias em que acordamos com uma palavra na cabeça, sem saber muito ao certo de onde ela saiu? Pois então, passei por esse momento dia desses e mais que breve decidi dar um famoso “Google” para ver se aquela palavra, tão estranha e ao mesmo tempo familiar aos meus ouvidos, de fato existia. Foi aí que descobri onde a tinha escutado...
            Discricionariedade - palavra diferente, que faz a língua enrolar e que conheci em uma das aulas de Direito Administrativo. A página da Wikipédia até me ajudou, mas não era o suficiente para uma futura gestora pública. Diante de alguns artigos e livros, nessa busca por sanar minha dúvida, encontrei algumas significações. Segundo Maria Helena Diniz, em seu dicionário jurídico, discricionariedade é “qualidade do que é discricionário ou a limitada liberdade de escolha e de decisão na edição de atos próprios de cada função”. Há para ela, uma definição mais específica para o âmbito da Administração Pública, o significado de discricionariedade administrativa, ao que diz:
[...] Discricionariedade Administrativa = poder do agente público de agir ou não agir, de avaliar ou de decidir atos de sua competência, dentro dos limites legais, segundo critérios de oportunidade em conveniência para a consecução de interesse público.
Dentro do que tenho examinado para essa composição, pude perceber que os discursos sobre discricionariedade estão focados em parâmetros jurídicos e filosóficos. De acordo com André Coelho, doutor em Direito e mestrando em Filosofia, discricionariedade é um termo colocado entre decisão vinculada – aquela em que se impõe um critério fechado e determinado, sem que haja outras decisões possíveis para a causa colocada; e decisão arbitrária – sem possibilidades para decisões erradas, uma vez que não se impõe critério algum para a tomada de posição; todas descritas a partir de uma tese positivista. Assim, quando fala sobre decisão discricionária, diz que a esta se impõe um critério que, embora determinado, é aberto. Com isso, utiliza-se como fundamentador da decisão o bom-senso do decisor, dando-o certa liberdade de escolher a melhor solução para a dada questão. Saliento, contudo, que qualquer das decisões precisa necessariamente estar sob a ótica das normas jurídicas.
            Neste tocante da Administração Pública, onde se encaixa o ato da discricionariedade, encontramos alguns princípios, determinados constitucionalmente, aos quais ela deve obedecer. Faz-se importante uma exposição desses princípios, uma vez que não é adequado aplicar a discricionariedade administrativa se não houver o exercício dos mesmos. De acordo com o Art. 37 da Constituição Federal de 1988, a Administração Pública deve obedecer aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência.
            Quando se pensa em legalidade a palavra que nos recorre é lei. Logo, o princípio da legalidade responde ao ato de se obedecer e exercer as funções administrativas de acordo total com as leis. É possível retirar que desse princípio partem todos os outros, uma vez que sem a atuação e o respeito mediante as leis, não há funcionalidade constitucional, nem administrativa. A necessidade ímpar de se agir com discricionariedade em momentos onde não há uma norma, onde o que se tem é a busca por leis que respaldem a decisão, acaba sendo argumento para essa afirmação.
            A impessoalidade vem também de encontro com o conceito de discricionariedade. Ao tratar esse princípio como sendo aquele em que se deve agir em favor do interesse público, com a aplicação de tratamento igual a todos, verificamos que quanto à discricionariedade, é sempre preciso livra-se dos dogmas pessoais para não agir em detrimento do interesse público, lembrando que a conveniência prescrita a esse ato deve ocorrer em confluência ao bem do todo e não do agente discricionário.
Por moralidade entendemos que as ações precisam embasar-se em princípios éticos e morais. No entanto, mais do que isso, quando colocada constitucionalmente, esse principio adquire características próprias da conduta esperada dentro da Administração Pública. Se ocorre fuga desse principio, ao se aplicar a discricionariedade, a probabilidade de errar a decisão é muito grande,  já que não encaminhou-se a decisão por uma moral administrativa, sendo uma conceituação própria, mais provável neste caso.
Permitir a todos tomar conhecimento das decisões auferidas, para que assim possam julgá-las convenientes a outros casos e até mesmo avaliar a eficácia de sua aplicação, são ações compreendidas no princípio da publicidade. A necessidade dos atos discricionários tornarem-se públicos esta no fato de mostrar o quanto de legalidade fora aplicado, por exemplo.
Por último, observa-se o princípio da eficiência, que tem por intuito discorrer não somente sobre a eficiência do agente público, como também da Administração Pública. Concomitantemente, observamos que se não houver eficiência da Administração, pouco haverá no agente, pois o controle sobre as atividades desses será comprometido. Da mesma forma que fizemos com os outros princípios, colocando-o a luz da discricionariedade, se não há eficiência em ambos, ocorre o comprometimento do ato discricionário, por não haver quem controle o que se discriciona, e por ineficiência do agente que o faz.
            Em suma, o que se observou no decorrer do artigo foi a ligação que há entre os atos e princípios. É mais difícil o funcionamento da Administração Pública se há na máquina pessoas despreparadas e desconhecedoras desse todo. A carreira de agente público tem como quesito principal a responsabilidade sobre o interesse público. A necessidade de abrir mão de conceitos e fundamentos próprios, buscando incessantemente o conhecimento administrativo são características fundamentais para que haja base para desenvolvimento da produção. Agir ou não com discricionariedade dependerá tão somente do tipo de decisão a se tomar, e das diretrizes dadas para essa. Agir com sabedoria e fazer o país não desengrenar, depende tão somente de se preparar e conhecer os meios pelos quais se agirá. A isso, eu chamaria de princípios, o principio de querer, de fazer e de bem atuar.
Referências:
COELHO, André. Positivismo Jurídico, Lacunas e Discricionariedade. Disponível em http://aquitemfilosofiasim.blogspot.com/2008/11/positivismo-jurdico-lacunas-e.html. Acesso em 18/11/2010
DINIZ, Maria Helena. Dicionário Jurídico. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2008.
KFOURI FILHO, Abrahão José. Caderno de Direito Administrativo. São Paulo: Editora Terra, 1995.
ROSA, Márcio Fernando Elias. Direito Administrativo, volume 19. São Paulo: Saraiva, 2003.
TOURINHO, Rita. A discricionariedade administrativa perante os conceitos jurídicos indeterminados. Revista Eletrônica de Direito Público, nº. 15, julho/agosto/setembro, 2008. Disponível em www.direitodoestado.com.br/rede.asp. Acesso em 18/11/2010.

Docente: Prof. Dr. Marcelo Arno Nerling
Discente: Louise Machado da Costa de Carvalho (louisecarvalho@msn.com) No USP: 6774572
A autora agradece à Tatiana e ao Alexandre Panosso a publicação do presente.

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